Em parte, também mato pessoas porque não posso – nem quero – fazer outras coisas que me permitiriam desafiar os limites do que é considerado normal. Abomino a conformidade mas também o espalhafato e a falta de inteligência. Se sabotasse o resultado do meu trabalho seria despedido após umas quantas advertências. Se me juntasse a uma claque de futebol para poder usar de violência de forma mais ou menos irrestrita teria de suportar a companhia de energúmenos – e de fingir ser um deles. Roubar não é opção – não desejo fazer algo apenas por ser ilegal. Na verdade, todos estes actos são ainda normais. Ninguém estranha que se torpedeie o trabalho ou que se roubem objectos. Ninguém estranha, ainda que procure convencer-se do contrário, que se exorcizem tensões destruindo o se apanha à frente. Não – já o escrevi: se um dia for apanhado, ninguém poderá dizer que fiz o que fiz por qualquer razão normal, mesquinha, compreensível. Hão-de coçar a cabeça, tentando perceber. E falharão, claro, porque as tentativas permanecerão tímidas, confinadas ao lugar-comum, balizadas pelo medo de entrar em áreas de onde talvez não se saia com facilidade. As pessoas não estão interessadas em chegar à verdade. Ouço-as até perguntando: que verdade? E sinto-me forçado a sorrir.